A lembrança desses acontecimentos ainda corroi a minha alma, ainda me trazem vergonha, dor e sofrimento. Tenho lutado para me livrar das marcas que esse episódio deixou em minha vida.
Foi em em uma manhã, inicio do
outono em Lydius, Draco havia partido em viagem para Kassau, na tentativa de
conter uma pequena revolta que se instalava na velha cidade, as Margens da
Floresta do Norte, reclamada pelos Iniciados. A caravana de Quintus havia
chegado à Lydius e pedi como de costume que Bors formasse uma pequena guarda para
me acompanhar até o acampamento do mercador, fora dos muros da cidade.
Eu estava
magoada com Draco,. O pequeno presente de Kamal para ele, Meera, a escrava
negra de Schendi, tinha se transformado no maior dos meus infortúnios. Eu a
descobri gravida de meu companheiro. Segundo ele, um lapso, um erro não
pretendido. Ele havia se passado no vinho da escrava. Tem ideia de como aquilo
soava para mim? Sabe qual o costume Torvalds para subjugar uma mulher livre?
Ela é atirada no circulo, contra a vontade, ou a encontra lamina da espada,
então o vinho lhe é dado e somente depois, ela é aberta. Eu o vi, tantas vezes,
fazer isso. Tantas vezes que já perdi a conta. Cada vila, cada cidade, cada
mulher tomada por ele como espólio. E com nenhuma, ele se "passou” com o
vinho. Pergunto-me, o quão fascinado ele ficou com ela, para querer que ela
desejasse o seu colar, para pular, todo e qualquer tipo de ritual que ele mesmo
se impunha para tomar algo que não deveria ter importância alguma.
Eu pensei que talvez
as compras me ajudassem a retirar essa nuvem negra e pesada que rondava meus
pensamentos. Devo admitir que tive ímpetos em mandar mata-la, em vendê-la como
fiz com outra escrava no passado. Tinha medo, medo que ele me trocasse por ela,
medo que a historia se repetisse, medo que o filho que ela lhe dava, filho ao
qual neguei quando me foi pedido, tomasse o lugar dos meus filhos, tomasse o
meu lugar em sua vida. Mas não podia. Ele sabia da gravidez, eu mesma ,
inocentemente o avisei. Achei que era filho de Kamal, e que teríamos um grande
trunfo contra o tahariano. Ledo engano.
Nada que
Quintus me apresentava conseguia tirar a dor que fazia morada em meu coração.
Por fim, decidi encerrar aquela visita infrutífera e retornar aos muros de
Lydius. Foi quando o céu se cobriu de negro, o bater de asas misturou-se ao do
vento e uma revoada de tarsman baixou em direção a minha pequena escolta.
Quintus tinha me freado o passo, incomodado com o fato de que eu não me
agradara de nada em sua caravana. Ouvi Seth, meu escravo gritar. Olhei para
cima e as garras daquele animal se fecharam em torno de mim. Senti-me sendo
levantada do chão por um bater de asas ensurdecedor, o solo ficava cada vez
mais longe e uma vertigem tomou conta de mim. O vento açoitava meu rosto , os
tecidos da minha roupa chicoteavam o ar. Ainda ouvi gritos e zunidos do que
pareciam ser flechas , mas a balburdia do momento ia ficando para trás e a
minha frente, os picos das arvores da floresta eram substituídos aos poucos
pelos picos gélidos da montanhas da Terra dos Torvalds. Eu era levada para o
Norte.
Foram dias vividos no
inferno. Um dos Jarls de Draco, insatisfeito com o rumo das coisas, resolveu
depor o Tarsk Negro e tomar para si o que era , segundo ele, seu de direito, e
atacou o ponto fraco do grande Senhor. Eu fiquei naquele acampamento por uma
semana, sob o julgo do chicote e a rotina do estupro. Mas não me submeti. Homem
algum , a não ser Draco , teria o seu colar em mim. Não no que dependesse de
minha vontade. Eu preferia a morte. O frio, a fome e as algemas rasgando meu
pulso pareciam me deixar em torpor. Pensava em minha casa, em meus filhos, na
incerteza do meu destino. Perguntei-me se Draco viria me buscar, duvidei, eu
sei, do amor que ele tinha por mim. Afinal, agora existia outra mulher que
trazia em seu ventre uma semente dele, e em Gor, a troca de mulheres era algo
tão banal, tão usual. Um novo contrato, uma nova Senhora do Norte, um novo
herdeiro do High Jarl, nada disso soava absurdo. E Ivar? Ele me deixaria abandonada
a minha própria sorte? Ele era a minha única esperança.
Confesso que
os dias tiravam minha esperança, eu já pedia a morte. Estava exausta. Meu
cabelo tinha sido cortado e já tinha passado por todo tipo de dor e humilhação.
O acampamento se preparava para partir. Eu sabia, que quanto mais o tempo
passasse , mais nos movêssemos, mais fácil seria perder a minha pista. Fui
colocada em um dos tantos vagões de carga, jogada no interior sujo de um deles,
coberta apenas por peles sujas e fedidas que mal me aqueciam. Foi quando ouvi
um grito ecoando no acampamento e percebi, que algo estava acontecendo. Era a
minha chance. A confusão se instalava entre os homens do lugar, forcei ,
chutando as tabuas velhas e podres do vagão ate que consegui arrebenta-las e
arrastar comigo o anel escravo que me prendia. Esgueirei-me na neve , por baixo
dos vagões. Havia luta, sangue, o lugar estava sendo atacado. Eu só pensava que
tinha que sair dali para não cair nas mãos de outro. Ouvi o guinchar de tarns
mas não olhei para o céu, foi quando senti uma mão me levantar do chão, Era um
dos meus captores que tentava impedir minha fuga. Debati-me gritando e um vulto
saltou sobre o homem que me pegava. Mal acreditei quando vi Seth, meu escravo ,
se colocando entre mim e o homem. Ele ia morrer, não era um escravo treinado, e
teria caído ali, diante dos meus pés , se não fosse Hakin, um dos homens de
Ivar a sangra o porco com sua espada. Ivar! A presença de Hakin significava que
meu filho estava ali, ele tinha vindo me buscar. Dobrei os joelhos chorando de
alegria.
Mas Ivar
, não tinha vindo sozinho. Entre as lagrimas vi a figura majestosa de Draco que
corria em minha direção, cortando com seu machado cada homem que se colocava no
caminho. Ele tinha vindo me buscar, não tinha desistido de mim, seu amor por
mim ainda existia. Naquele momento , eu era a mulher mais feliz de toda Gor. O
seu amor, ainda era meu!
Lady Kalandra
High Jarl's Woman do Norte
Tatrix de Rive de Bois
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